Quem sou eu

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Uma vez me perguntaram: “Os precipícios não o amedrontam?...” Respondi com outra pergunta: “O que sente quando vê um falcão em vôo?...” Ele respondeu: “Paz e plenitude!” Os seres alados jamais se amedrontam com as montanhas, paredões ou precipícios... tudo faz parte da sua trilha, do crepúsculo da alvorada ao poente... do dégradé do início da noite à poeira de estrelas da madrugada. Dizem que homens não podem voar... que o vôo é atributo dos pássaros. Provaremos aqui, em cada linha, que só não voa quem se elegeu eternamente ao patamar das lagartas... Este espaço, não é um convite ao vôo, mas o azimute para que encontre sua crisálida, para que vença o medo da escuridão e mergulhe nela. E no desvendar de si mesmo, possa então estilhaçar casulos e galgar os píncaros distantes da perfeição do próprio vôo. (2/04/2009)

sábado, 26 de dezembro de 2009

ZACONIO


Que possamos fazer diferente...
Saírmos do marasmo da mediocridade,
Do torvelinho do mundo imediatista e individualista.
Que nos espelhemos e andemos junto com os melhores,
Não os poderosos de coroas reluzentes e alma podre...
Mas aqueles cuja alma resplandece e possuem ideais nobres,

Pois estes, enfeitarão o mundo como raros diamantes
E certamente brilharás entre eles...
Pois herdarás as asas que elevam os puros de alma
A galgar os píncaros distantes da perfeição.

O mundo anseia por heróis,
Não aqueles que morrem sem sentido algum
Mas aqueles que bem sabem viver...
Como os 300 apaixonantes espartanos
Nos abismos das Termópilas,
Que revoaram balbuciando o zacônio, seu dialeto esquecido
Portanto viva! E recite a cada dia o poema de Towreau
No "Carpe dien" dos apaixonantes insanos

Pois o tempo urge para que colhamos
Os botões de rosas que não tardam seu fenecer...
O esquecimento envolve com sua sombra
Quase todo homem que morre...
Mas suas ações no mundo se perpetuam atemporais
Muito além dos horizontes que as pupilas convencionais
Podem enxergar e perceber.

Por isso voe, no farfalhar de gansos selvagens
Pois nosso bando estará acima da racionalidade
Dos pensamentos das lagartas
Que acham que não podem,
O que estão prestes a alcançar... Os céus!

Edson pereira
Salvador-BA – 12/07/2007

YIN YANG


Não é, para o poeta, a aparente beleza,
A paz, a luz e a imediata harmonia
A essência da sua dialética astral
E da materialidade dos seus pensamentos
Transformados em versos...

O antagônico também em beleza se mimetiza,
Um Satanás que em anjo da arte se transforma,
Ou o maldito que se converte no bendito recitar...
O Fruto letal e proibido, desejado e fluídico passa a ser,
O Indefinido inspira as profundas paixões...

De dor infinita, arte em línguas se converge,
Bocas, gestos e silenciosa melodia.
Como a natureza morta ou o cubismo para a pintura,
Ou a queda, transformada num movimento harmônico do balet,
O erro, improviso mágico do ator...
As notas oitavadas de um violão ou o rasgar do violino...

Tudo, tudo, tudo!... plenitudes...
Orgasmos opostos da cega incompreensão
Refletidos no espelho da dualidade inversa
Navegados por poucos na ousada canoa
Que transitam calmamente entre o maremoto
da sutil e tênue percepção

Os ousados, ostentam o símbolo mágico
Do yin yang brilhando no pescoço e na mente,
Invisível o é para todos que só enxergam
Apenas o negro ou o branco,
O ilusório bonito ou o feio,
A linguagem culta e o senso comum
Da montanha mágica da beleza,
uma única trilha se pode seguir.

Perceber impossível é, que transitamos entre duas pernas,
Envolvemos num único abraço, entre dois braços,
Pensamos, com dois hemisférios cerebrais,
Enxergamos, com dois olhos,
Mas resumimos tudo isso e muito mais...
Através de uma única boca...

E que simbologia melhor
A anatomia e fisiologia humana nos pontuar poderiam
Ampliando nossa visão e nos transformando
Na unidade supremas, representada pela esfera oriental
Da luz e da sombra que refletem um único brilho
A sensibilidade...

Edson Pereira
Salvador-BA – 18/07/2008

XAMÃ


Os passos são sempre inspiradores...
Incitadores e motivadores
Dos seres feitos de sonhos, nós...
Mecanismo complexo
Cheio de necessidades simples
Apenas a vida nos basta por si mesma

Uma montanha a ser escalada
Uma trilha a ser desbravada
Uma cachoeira descoberta
Chuva no rosto, sapatos sujos de lama...
Somos a própria metamorfose em movimento
Ânsia da vida mimetizada de carne

Moinhos de vento,
A liberdade de Prometeu,
A guerra nas Termópilas,
A morte dos Xamãs...
Nenhuma delas são batalhas vencidas...
Todas elas são conquistas certas
No universo metamórfico dos seres pensantes

Desprovidos de asas fisiológicas
Mas essencialmente bem dotados
De peito e cérebro alados...
Ilimitados, atemporais e imortais
Na sua mais pura construção humana

A ciência nos diz que o homem é o único ser
Capaz de sacrificar sua vida por opção própria...
Mas o que a razão cética jamais entenderá
É que o homem, tal qual o Xamã, precisa de vôos e sonhos
E o que a fisiologia chama de ausência de asas
A emoção chama de infinito planar.

Edson Pereira
Lauro de Freitas-BA – 08.06.08

WORKAHOLIC


Amanhã surgirá um novo alvorecer...
E com o nascer podeis dizer:
Quão lindas são as manhãs!
E como podem ser lindos os dias,
As tardes, as noites...

Basta que saibais viver o DIA!!!
Sorver o néctar do presente...
Pois verdadeiramente o dia
A vós é dado como "PRESENTE".
Portanto, que vivei o vosso presente,
E aproveiteis do "PRESENTE" que a vós é dado!

A condição de errar, de sorrir e chorar...
A capacidade de engatinhar infante pelas manhãs
Correr viril e pleno pelas tardes e
E arquejar apoiado nas muletas da experiência pelas noites...
Escrevendo o livro da vossa própria existência

E que “PRESENTE” poderia ser mais devotamente desejado
Senão viver o presente com todo dolo dos erros
Pois os dias não voltam para trás
E a noite não eterniza o orvalho não sorvido pela manhã
Deixando em branco páginas no meio do capítulo...

E o que o ‘workaholic’ diria no final do seu livro?
Quando a muleta da experiência lhe cobrasse
E enredo mágico da sua história...
Onde a proximidade do casulo clama, anseia, grita,
Implora pela dádiva das lembranças bem vividas...

Mas a fatídica inércia, cruel sempre será
E os juros do arrependimento
Cobram no futuro alto preço pelo “PRESENTE”
Relegado à tardia teia do esquecimento

Sois o artista que pinta a cada dia
A obra prima estampada nas asas
Das borboletas de luz que sois vós mesmos
Como lagartas, recebeis a cada dia, os pincéis e novas cores
Vosso rastejar representa a beleza estampada para o mundo
Do “PRESENTE” que recebestes do Cosmos!

Edson Pereira
Salvador-BA – 05/04/2008

VÔOS HUMANOS


E por que acreditar que homens podem voar?
Nem bem chegaram e donos são da pretensão
E o sonhar proibido tornaram
Em gritos tonitruantes que ecoam em longos brados

Tornando o simples algo complexo
Como lagartas aprisionadas ao cotidiano
Sentam... ouvem... balbuciam...
Palavras soltas sem significado

Apenas um olhar e um sorriso
Iluminaram mundos inexplicavelmente
Como se pudessem lembrar
Quem cedeu a mão de apoio nos primeiros passos

“Mas isso não importa!” Exclama o sorriso.
“Lembro-me bem do primeiro vôo
E da preamar da plenitude
Que loucamente há tanto fugi
De coisas que sempre ansiei fazer.”

Medo teve de abrir as asas
Como também o pássaro
De encarar lábios e olhos tão convidativos
E quem mais medo experimentou?
O homem temendo os ares,
Ou o pássaro apavorado com a paixão?

Tão audaz resposta incapaz seria de revelar
Pois o enigmático sorriso com suas palavras sem verbo
Num alucinante eco mental reverbera
Transformando complexidade em simplicidade,
Medo em ousadia, apatia em possibilidade
Como se a força das mariposas nuas
Pudesse ressuscitar a imaginação.

A distância está intimamente ligada
Ao fio da lembrança
Que desafia a ampulheta do tempo
E a pseudo-amplitude do espaço
Unindo utopicamente aquilo que não pode se tocar

E por que não tocar?
Se o instinto faz parte da raça humana
Nos impelindo a viver em vez de
Se arrepender de não ter bem vivido
Afinal...
Por que acreditar que homens não podem voar?

Edson Pereira
Salvador-BA – 24/05/2004

UM BRINDE À ETERNIDADE


Quem de nós,
Erigindo o cálice aos céus
Proclamou um brinde à vida?
Parafraseando a melodia que harpas silenciosas
Presentearam aos ventos do norte

E mesmo entre dores e choros
Ainda assim sorriem em sonhos
Num aspirante ideal alado
Mesmo que disfarçado de Ícaro
Ante fúnebre abraço de Hécate

Correndo em taquicardia pelo labirinto do pavor
Sentindo o arfar do monstro devorador
Perante o olhar melancólico
E as lágrimas do arrependimento
Do Dédalo autômato construtor de torturas

Quem dentre vós têm peitos e braços
Dos heróis mortos em batalhas?
Seus corpos jazem inertes,
Mas suas consciências pairam incólume
Na imortalidade dos que quebraram grilhões

Pois sempre nunca temeram os riscos
Nem titubearam entre coragem e covardia
No afã dos que rompem crisálidas
Pelo simples prazer do farfalhar das borboletas
Que varam o infinito num rápido sorriso de instante
Que flutua para nunca mais voltar

Mas não procureis lógica no que não podeis explicar
Pois pássaros foram feitos para os céus,
E morcegos para as cavernas...
Enquanto uns deleitam-se plenamente com a luz
E com a liberdade dos que voam
Outros, repelem o clarão e enclausuram-se na própria vontade
Em eutanásias que fingem libertar

Mas brindemos à vida,
Pelo sorriso e pela dor,
Pois as espadas só doam seu poder aos imortais
E no gume de suas lâminas mostram as duas faces da vida
No tilintar dos brindes eternos

Edson Pereira
Governador Mangabeira-BA – 17/05/2003

TINIR DA ALMA


Minha alma é um poço de sabedoria
E conhecimentos adormecidos
E as palavras não são somente
O burburinho diante de mim.
Embora tenha que suportar a camuflagem
De línguas hipócritas disfarçadas em dizeres belos
E sem conteúdo que possam vir a significar
O ósculo sincero que busca o meu espírito

Me enxergam distante e distraído
Longe do mundo e de suas neuroses,
Mas em sua visão limitada
Dirigem seu foco apenas para meu corpo
Sem alcançar ou vislumbrar minha alma,
Que flutua em terras longínquas

Pensam que preciso de voz
Para fazer tinir meu brado bárbaro
Sobre os telhados do mundo
Que abafam os ouvidos entre travesseiros
Sem conter minha voz
Perscrutando indômita as mentes da negação

A maior escravidão
Vem dos grilhões do cérebro
Que não permite ver ou sentir
E disfarçam-se de poder
Com chicotes e gritos loucos
Achando que dominam,
Terminam dominados pela própria
Ignorância de si mesmos


Edson Pereira
Salvador-BA – 12/12/95

SILENCIO


O silêncio é a melodia inaudível
Onde a magia ganha formas
É espaço imaterial preenchido de deduções,
O movimento mítico que doa asas à criatividade

E porquê não dizer:
O erigir da poesia
Desabrochado das brumas
Tão escondida do medíocre cotidiano

É círculo atemporal e infinito
Árvore frutífera de fúteis sabores verdes
E suculento altruísmo pronto para colher
Dualidade dicotomizada de opostos

É o nada para o ignorante
E de infindáveis possibilidades
Para o visionário
Um motivo para se poder sorrir
E uma causa para se querer chorar

Por isso tão temido é...
E tantos buscam desesperadamente
Expurgá-lo de suas existências
Por temor ao mergulho no próprio âmago
Que desmascara “Eus” ocultos
Pelos espelhos de “Meduza”
Ou retratos de “Dorian Gray”

Mas algo tão desprovido de matéria
Poder não deveria ter
Para subjugar tão “sábios seres”
Que de consciência alada
Estratosfera alcança

Mas o véu se descortina...
E o inocente silêncio se abstém da culpa
Não é ele o grande tirano do pavor dos homens,
Mas, as lacunas internas de cada um
Que pagam a preço de ouro
As entrelinhas da própria alma

Edson Pereira
Salvador-BA – 25.04.2005

REALIDADE DA UTOPIA

Que busco eu, homem do ar ?
Cavalgando no meu corcel de oito patas
Arrancando lascas de fogo dos céus
Como se o próprio Odin
Me desse a benção dos deuses para sonhar

Que fazes tu, neste mundo de fadas ?
Sorrindo com lábios convidativos
À tua doce saliva entre eternas maçãs

Que fazemos nós, olhando nos olhos um do outro ?
Digladiando-nos na incógnita vazia e silenciosa de ais
Enfrentando o turbilhão dos complexos
Que pulam do inconsciente de superegos imbecis

Que fazem os anjos chorando lágrimas de estrelas cadentes ?
Dizendo: amem-se ardentemente
pois não podemos amar com tamanha simbiose
nem nos tornar deuses como vós
Enquanto os demônios retorcem-se nos abismos sombrios
Confabulando os covardes, tramam idéias
Temem os deuses homens sedentos de amor
Pois poder maior não pode existir

E os exilam no recôndito mais profundo
Desagregando a simbiose em dois mundos antagônicos
Banindo o homem lua com suas muitas faces
A vagar pelas noites sobre quatro patas
Chorando em uivo estridente pela dor dilacerante e sem ferida
À mulher deram o calor e os raios do sol que penetram em toda parte
Menos na noite, onde se esconde quem ela mais deseja
Embora como águia solar voe por toda parte com a infinita liberdade
Tamanho cárcere não poderia haver
Nem cruelantes correntes poderiam maiores penúrias gerar

Mas tamanho foi o sentimento que varou a imensidão dos céus
E astutos, os anjos enfeitaram os crepúsculos de harmonia e beleza
E aos proibidos de amar, segundos se tornaram infinito
E a placidez azul do céu, tornou-se de um vermelho dourado de paixão
Entre corpos viris, suores, mãos e línguas criativas
E os uivos tornaram-se gemidos, e das asas
Brotaram espasmódicas contorções orgásmicas

E os andróginos anjos por milésimos de segundos tornaram-se amor
Enquanto os demônios dilaceraram-se de uma infinita dor e ódio
E o tempo deixou de ser tempo...
E a vida deixou de ser vida, e passou à condição etérea de eternidade
E o sonho se tornou real...
No meu próprio sonho.

Edson Pereira
Wagner-BA – 20/11/1998

QUADRO DE CRONOS

O tempo é o cruel conselheiro dos insanos!
Desliza rápido e voraz como água nas mãos
Que não conseguem reter os ponteiros da vida
Que a labuta traçou a mediocridade que petrifica
E retorna os ideais ao recôndito da eternidade
que devora vidas, almas e sonhos

E comumente audaz desperta
Cínica, irônica e sadicamente
Quando a seiva, pétalas e viçosas folhas
já estão no ápice do abrupto fenecer
E quando a flor murcha, as raízes secam
E o deserto da existência se instaura

Arrogante e profundamente invasiva
Sorrateira como a emboscada do guepardo
O tempo não teima mais em extinguir-se
Desloca-se como areia molhada
De uma pirracenta ampulheta
Que teima em não correr

Pois a memória, então inerte,
Tenta, busca, implora, clama
Por lembranças bem vividas:
Uma aventura conquistada,
Uma ousada transgressão,
Um mergulho louco e impávido
Numa irracional paixão,
Ideais dignos de serem vividos,
Impulsos inconsequentes e incandescentes,
Compulsões descontroladas...

Mas não!!!
Apenas o imenso, vasto, espaço intacto
Incólume de ousadias e risos
Preso na eternidade da ausência de lembranças,
No redemoinho dos sorrisos
E no desmoronar das esperanças...

Enquanto algumas borboletas voam
milhões de lagartas são esmagadas e detetizadas
mas continuam na obrigação e no consumo das folhas
Ensurdecidas pela orquestra audaz das engrenagens
Não se arriscam nas crisálidas
E não percebem as nuvens nocivas
Que lhes arrancam a alma

Devoradas como filhos do deus titã
Aguardam a ousadia do erege
para enfim, deleitar-se na erupção da liberdade
Ansiada por muitos, mas longínqua
como quadros de Cronos...

Edson Pereira
Lençóis-BA - 18/05/2006

PERMITA-SE

Estou mais perto das nuvens do que deveria estar
Sonho mais do que deveria sonhar
A aventura tornou-se a amante perfeita,
O lábio mais desejado,
O prazer mais ansiado.

E quando ando de mãos dadas com a solidão
E o tempo, e a vida, e o abismo não me amedrontam
Pois sei que vivi, e gozei e sorvi...

E o sofrimento das derrotas
Foi acalentado pelo sorriso do aprendizado
Da ânsia da vida por si mesma
Do poder de ser pleno...
Pois o real pecado nunca esteve presente nos erros,
Mas no receio que escraviza.

E as muitas vezes que rompi correntes
Pude voar com a liberdade dos pássaros
E gargalhar dos erros sem culpa:
Ultrapassar barreiras;
Escalar montanhas;
Beijar lábios proibidos;
Sugar a essência do existir;
Conquistar o dom de sonhar e a plenitude de voar


E sem querer,
Tornei-me a própria metamorfose dos seres alados:
A pureza do Unicórnio;
A impavidez do Pégasus;
A ousadia de Sleipnyr;
A exuberante beleza das Borboletas.

Quantas lágrima haviam antes
Angustiado o seio de Gaia...
E quantas carícias de Afrodite não percebi...
Atormentado pelos os grunidos do Minotauro da angustia,
Do poder da dor que dilacera,
Perdido no labirinto da culpa,
Por medo de voar como ícaro e encontrar os braços de Hades
Na escuridão do abismo dos preconceitos.

Agora abrace-me sem medo,
Pois todo temor que experimentas agora
Já mui intimamente também apavorou-me.
Seja nesta noite minha simbiose
Na patogênese univitelina de sentimentos
Rumo ao inconcebível...
Permita-se ser louco, ser sonho,
Ser aventura...
Permita-se voar!

Edson Pereira
Salvador-BA – 12/04/01

O DOM DOS DEUSES


Um dia sonhei que podia voar
E a invencibilidade me presenteou
Com as asas do impossível
Me vesti de pétalas e perfumes
No planar dos aromas que perscrutam olfatos

Me lancei aos pegos
como se dos precipícios
pudesse tirar o dom de voar
em rasantes pelos arrebóis da vida

E dentre tantas flores
Apenas uma não feneceu
E arriscou lançar-se aos ares
Com o arrojo dos heróis
Que não tombaram nas batalhas
Pois sempre nunca se sentem impotentes

E no galopar de mil patas
O farfalhar de flâmulas em frangalhos
Não tira a glória de peitos bravos
Nem as feridas da peleja
E as penúrias do longínquo trajeto
Jamais apagarão dos olhares brilhantes
E vibrantes a paixão em forma de luz

Por isso digo que vale a pena voar
Mesmo que sem asas
Porque somente os que se impelem aos abismos
Desconhecendo o poder imprevisível dos imortais
Podem conhecer o abraço dos ventos
E somente os que se arriscam
Experimentam o dom dos deuses

Edson Pereira
Salvador-BA - 22.03.03

NOSSA BANDEIRA

Existe um povo que se orgulha de uma bandeira verde
Coberta de infâmia e covardia
Manchada pelo rubro sangue do seu povo...
E chamam isso de “Ordem”

E a deixa transformar nessa festa de ignorância
Entre melodias sensuais que não dizem nada
Apenas corpos dançantes exibem nádegas avantajadas sem cérebro
Para encobrir a fetidez por detrás da orgulhosa flâmula
De manto impuro que sustenta os poderosos
Fazedores de guerras e misérias...
E chamam isso de “Progresso”

“Meu Deus! meu Deus! mas que bandeira é esta”,
Que assiste homens devorando homens?
E conivente, sorri do miserável embaixo da ponte
A mirar inerte a morte do próprio filho,
Desesperado, clamando pelo seco seio da pátria mãe...

Silêncio! O luto chega... o homem chora, e chora tanto
Que acorda os hipócritas nos arranha céus.

“Calem-no! Queremos dormir o sono dos que trabalham.”
(E como trabalham)
Mas o pranto do homem ecoa inconsolável...
Tamanha voz não poderia ser calada com migalhas de ironia.

E no noticiário pela manhã:
“Mais um indigente morto com cinco tiros
Provavelmente por uma gangue de rua”.

As gargalhadas estridentes rompem os arranha céus,
Cruelantes com seus corações de pedra:
“Não mais interromperás o sono dos que trabalham”.
(E como trabalham)

Pois na constelação da nossa bandeira
As únicas estrelas que brilham
São os poderosos e suas ideologias

Enquanto no triste fundo azul marinho
O ulular fúnebre do choro dos miseráveis
É relegado ao recôndito da escuridão mais profunda
Ofuscado pelo brilho das estrelas do poder
E amordaçado pelo arco de “Ordem e Progresso”.

Mas afinal, qual é a nossa bandeira?
É o estandarte sombrio da vergonha
E do infinito pecado de ter nascido negro, pobre,
Sem cultura e sem direito de ter...

Ou a brilhante e resplandecente
Utópica esperança de transcender
A constelação de Orion e tornar-se também
Uma estrela brilhante e desmemoriada.

E volvendo as costas ao fundo azul,
Ensurdecer-se ante pegajoso e simbiótico lamento.

Qual a saída para nossa bandeira?
Retirar as estrelas?
Projetar o fundo azul, que se tornarão futuras
Estrelas da amnésia?
Desatar o arco que amordaça?
Ou esperar o juízo final,
Acreditando na longínqua Justiça Divina
“Deitado eternamente em berço esplêndido”?

Não sei!!!
Mas enquanto isso...
Ao nascer e ao pôr do sol
Ergamos a farfalhante flâmula negra... digo, verde,
E choremos... digo, cantemos o “Ouviram do Ipiranga...”

Edson Pereira
Salvador-BA – 11/11/2000

MOTOSSERRAS


Como é possível que você seja capaz
De ver tombar a grande vida tão audaz
E no silencioso grito crepitar de galhos vêm ao chão
Calando o canto do uirapuru e do cancão
Que voam ao longe fugindo da devastação

E motosserras em seu som tonitruante
Debridam vidas tornadas em pó ao vento lacerante
Descomunais gigantes meigos vêm ao chão
São transportados em chaci de caminhão
Fazendo o lucro dos que se sentem o campeão

E no tombar da vida cifras em gritos clamam
O nome dos mortos que sem a clorofila choram
É itauba, muirajussara, cupiuba
Massaranduba, ipê roxo, tanibuca
E desmoronam a majestosa guaruba

Pau jacaré, mandioqueira rosa, jatobá
lauro preciosa, angelin pedra, timboraná
Esperam aflitas o elétrico machado que as derrubará
E nem o índio que o antigo protegia
O cocar moderno às matas tem alergia

E pelos céus se pode ver em fundos arcos
Das nossas matas que se desfazem em buracos
E em negro carvão de florestas pastos transformados
Enquanto os povoados espalhados passam fome
Escorrem pelos rios a morta riqueza que a nobreza consome

Índios e brancos se pintam para guerra
Pela posse e poder da exploração da Gleba
E a mão pesada da lei aplica sanção
Para aqueles que o machado tem na mão
Mas livre na limosine está o patrão

Entre tudo isso me deleito atravessando o igapó
Suor no rosto, pés encharcados e o medo ao redor
O prazer diletante do canto e revoar dos pássaros
O aroma das ervas e os ciprestes nos campos
Entre as trilhas escarpadas ando em largos paços

Alheio procuro estar a toda tormenta
Que rouba, devasta, destrói e violenta
Dos que exploram a mata poucos procuram ajudar
Aos ilhados, doentes e curumins a chorar
Gente que morre esperando socorro chegar

São aldeias que entre a mata e rio flutuam
Sonham com a vida e a tudo aturam
Índios e mestiços que aprendi a admirar
Por jamais perder a capacidade de sonhar
E muitos os criticam por árvores cortar

Mas lá de Brasília é muito fácil julgar
Desmatam, poluem, como em qualquer outro lugar
Mas cá na Amazônia... Isso nem pensar!
Pois todos são donos! Discursa o político
Mas eles têm médicos como todo rico

Não morrem no igarapé remando em canoa
Não comem palmito quando a mata escoa
Então me pergunto se aquele que aplica a punição
Que proíbe que o pobre jogue o ipê no chão
Já se colocou no lugar de quem é desta região

Que é ribeirinho, índio ou mestiço da terra
Que vivem esquecidos pros lados desta Gleba
Que não têm digna escola, estudo ou informação
Apenas vontade de vencer com a própria mão
E são condenados por nossa própria nação!

Edson Pereira
Gleba Nova Olinda-PA - 17/12/2009

LIBÉLULAS

Ei?! Despertes para o mundo dos sonhos...
Almas flutuam ao seu redor
Acima das brumas dos tempos
Buscando um mergulho profundo
Como se os ponteiros da vida
Nunca tivessem girado
E transformado carne em pó
Dissipando abraços em saudade
Esquecendo de rostos inesquecíveis

Mas os sonhos nunca deixam de existir
Sutil como o planar das libélulas
Cintilando nos lagos da noite
Como se beijos estalassem em tua face
Eriçando a pele em arrepios de luz
Entre lágrimas que escorrem do teu rosto
Desbravando como o escalador
A geografia das tuas curvas

Asas se abrem então, entre as nuvens
Onde antes não acreditavas existir
Pois distanciaste tanto os sonhos
Da mansão da tua alma
Que larva te tornaste por quase três segundos

Por isso, convido-te hoje aos vertiginosos vôos
Sem medo dos abismos hostis
Pois voltaste à imortalidade de onde saíste
E elegeram-te o cetro e a coroa de tua liberdade ansiada
Pois só os puros de alma podem amar
E planar entre os sonhos proibidos
E olhar nos olhos das almas que perambulam à sua volta
Sem medos e receios, mas com uma ânsia profunda
De perscrutar os sonhos alheios...

Pois quase nunca erigiste a magia do espelho
Onde recebeste o dom de se enxergar com o olhar do oponente
E buscando conhecer a ti mesmo, passas também a conhecê-lo
Desvendas então o grande mistério:
Teu inimigo, ama tanto quanto ti;
Sonha tanto quanto ti;
Busca as mesmas coisas...

Dissipam-se então as batalhas
E sonhos mesclam-se em simbiose
Transformando o universo antes fragmentado
Na unidade primária mais antiga que o Senhor do Tempo
- Olhai que lindo!!! Ao longe farfalhar de pássaros!
- Não percebes?! Não são pássaros... são cavalos alados, silfos e fadas!
- O quê? Mas estas coisas não existem, pertencem ao mundo da fantasia!
- Isso mesmo! Pertencem ao universo que libertaste da dicotomia...

A diversidade então se fez Unidade Suprema
Romperam-se as fronteiras e as guerras;
As raças, únicas se tornaram;
As classes sociais se fundiram;
A fantasia invadiu a realidade;
O racional mesclou-se ao emocional;

E os fragmentos do Universo
Erigiram-se no cristal mais belo
E demos a Deus o brinde das estrelas
E Ele deleitou-se com o néctar perfeito...
Meu peito irradiou-se de felicidade
Lágrimas sorrindo brotaram da minha retina
Com a face úmida, inundada de harmonia,
Então, acordei!!!

Edson Pereira
Salvador-BA -22/12/2007

KOAN

Definir o indefinível
Como se buscar as elipses
Das torrentes do existir
Possível fosse

Desafiar os enigmas da esfinge
Por uma simples resposta
Que resignifique uma existência
Galgando os píncaros
Das montanhas do viver

Esperando o momento da colheita
Que a Átropos ceifa
Mais cedo ou mais tarde
O fio da existência
Tão insanamente irrefutável

E a aranha que tece a teia
Mal não pratica,
Mas bem também não instaura
Nas mandalas das cartas koan
Que começam no desabrochar
E se estendem além das muralhas
Do eterno fenecer
Nas incógnitas das palavras do inconsciente

A pergunta lançada
Como resposta do enigma chinês
Puro zem o homem torna
Ou lança-o ao recôndito profundo
Dos pegos irrecuperáveis da loucura

Ou o vazio torna-se completude,
Ou o real orna-se do abstrato
Como gotas yang de nankim
Em leitos de rios vermelhos
Que diluem em dégradé o marrom

E a sabedoria ansiada
Retirada do homem é,
Como o alimento do cego Fineu
É abruptamente roubado
Pelas harpias vorazes

Esfomeados e sedentos
Estamos diante da vida
Que nos rouba segundo a segundo
Os “insight’s” que a amnésia nos tirou
Deixando como prêmio
O tabuleiro vazio
E a etérna dialética paradoxal
Que o koan nos traçou

Edson Pereira
Salvador-BA - 02/06/2006

Juncos de Guerra

Sou qual os juncos de guerra
Tripudiando nos oceanos orientais
De um lado a batalha,
Do outro, a placidez dos mares

Se a morte sorri para ti
Ela pode se apresentar com dois aspectos:
O de um monstro aterrador,
Ou com a expressão do ser mais belo que já se viu

Em ambas as condições
Teu semblante dará forma ao desconhecido
Teu medo a elegerá tua inimiga
Transformando-a no que mais temes

Tua branda reciprocidade
E a retribuição do sorriso
A dará qualidade mais bela
Da qual jamais viste

E quem sabe assim,
Na construção desta dialética
O bailar do moribundo ou do vitorioso
Não erijam das batalhas um mágico planar?

Seja no reino da carne ou no templo de Hades
O solene sorriso celebrará a ausência do medo
A posse do baluarte inexpugnável de si mesmo
A plenitude suprema do reinado íntimo

Nisto reside a maior conquista do ser
Não a vitória sobre o maior inimigo...
Mas, navegar na placidez dos juncos
Rumo aos tesouros inóspitos de si mesmo.

Edson Pereira
25.12.2006